domingo, 22 de outubro de 2017

SUSTENTO DA ALMA - DOM JUANISMO

Desenho de Gorka Olmo

PREFÁCIO (ANDO):
O El PAÍS, em 20 de Setembro de 2017, publica uma matéria acessível sobre o DON JUANISMO 
ou MITO DE DON JUAN, que merece ser lido e, entendido, 
como denúncia e como arma de protecção aos encantos 
de todos os que se movimentam na esfera do narcisismo psicopático, embebido numa doce e sedutora disponibilidade e empolgamento, até que a vítima deixe de estar na sua interesseira alçada manipulativa. 

A competência de encantar, encantando-se a si próprio, é falível, como todas as outras competências ... basta não cair nas pálidas tentações que dele emanam, e as feridas do encanto e da magia começam a manifestarem-se.

Recusar e contrariar, algum dos intentos do juanismo, obriga-o a mostrar o verdadeiro rosto. 
Surge, de imediato, o ódio, a impaciência, o medo, o desespero, tatuado em todo o facies. 
Desaparecem as cores do psiquismo da sedução e aparece o baço do tirano. 
Contrariar e não ceder, e a imaturidade e o carácter enfermo mostram as suas garras. 
Mostrar determinismo é mortal para o manipulador conquistador. Surgem as ambivalências e 
inseguranças quando as convicções da sua admiração e desejo de ser amado são beliscadas.

A validação do mito de Don Juan é aplicável tanto em relações de natureza amorosa, 
como em profissionais, familiares, sociais ou quaisquer outras ...! 
Resta perceber o antídoto, para que o seu extermínio da praga comece.

Enquanto lhe é vantajoso, injecta-se de delicados e sedutores sorrisos, promessas de encanto, 
eternas dedicações, declaradas benfeitorias e paixões disponíveis.
O desprezo, a saturação e a humilhação sobre a vítima, vem depois, 
quando precisa de novo sangue, repetindo e perpetuando o esquema.

Em suma, Don Juan, ... é uma bicha oportunista, incompleta e incubada ... 
travestida de narcisismo psicopático, exibindo-se para se esconder.

Desenho de Gorka Olmo. 

 
EL PAÍS (20 Set 2017): 

"Da psicanálise à falta de hormônios:
as explicações para o “donjuanismo”.

O Don Juan é um viciado: sedutor compulsivo, infiel e insatisfeito

Poucos mitos nascidos na Espanha são tão universais como o de Don Juan.
O sedutor insaciável inspirou artistas e escritores, de Tirso de Molina a José Zorrilla, sem esquecer de Prosper MériméeAlbert Camus e Lord Byron. Seja sob o nome de Don Juan ou de Casanova, o arquétipo foi alvo de incontáveis análises para tentar explicar o comportamento desse tipo de gente. Embora o donjuanismo possa ocorrer em ambos os sexos, costuma ser associado aos homens.
Quem sofre dessa síndrome é um sedutor compulsivo, infiel e insatisfeito. Sabe bem como conquistar, porque é um sábio manipulador das emoções. Mas quando uma pessoa se apaixona por ele, a abandona na hora, para começar a seduzir a outra. O sexo é o de menos para ele, não é o protótipo do garanhão que vai de cama em cama. O que lhe interessa, o que verdadeiramente lhe excita, é o cortejo sentimental, a paixão dos primeiros dias. Uma vez que a consegue, quando tem a certeza de que esse alguém está disposto a tudo por seu amor, perde o interesse. Pode manter uma relação de anos por pressões sociais, inclusive pode sentir afeto, mas não será fiel. Platão dizia que só se deseja o que não se tem, e é isso o que acontece com os afetados pelo donjuanismo. Muitos especialistas já tentaram explicar o porquê dessa conduta compulsiva e insaciável, da sua incapacidade de construir um amor estável e duradouro.
Para Freud, pai da psicanálise, o Don Juan está preso na fantasia edipiana de ser o alvo da paixão materna. É um homem emocionalmente imaturo, de perfil narcisista, que procura a figura da mãe em cada mulher que seduz. Quando consegue seu amor, não pode senão abandoná-la, fugir dessa relação que, para seu inconsciente, seria incestuosa. Assim, jamais conseguem estabelecer uma relação amorosa; vivem retidos nesse loop de busca e abandono, passando da entrega absoluta ao mais desalmado rechaço.
Bom conhecedor de Freud, o médico e escritor espanhol Gregorio Marañón (1887-1960) também estudou a fundo a figura de Don Juan e lhe atribuiu uma personalidade narcisista, com uma homossexualidade latente sob seu caráter gozador. Embora o escritor Albert Camus argumentasse que esse personagem se apaixonava por todas as mulheres, o psiquiatra e sexólogo Adrian Sapetti suspeita que ele só “acredita estar apaixonado”, já que depois da conquista esse sentimento nunca chega a se fortalecer. Se a presa se mostrar indiferente ou o rejeitar, o sedutor insatisfeito, valendo-se de todas as suas artimanhas, persiste até conquistá-la. Trata-se, portanto, de um sentimento muito primário, carente de profundidade.
Manuel de Juan Espinosa, catedrático de Psicologia da Universidade Autônoma de Madri e especialista nos mecanismos do amor, sustenta que os Don Juans sentem, de fato, um tipo de amor real, embora sua essência seja volátil e fugaz. “É uma espécie de sentimento que estoura feito rojão; essas pessoas da mesma forma que sentem uma euforia sofrem um baque.” O professor explica que os sedutores compulsivos são “predadores amorosos que na verdade se apaixonam pelo amor, pela sensação que lhes produz o fato de alguém se apaixonar por eles, e pela ideia de estarem apaixonados”.
Essas poéticas afirmações têm uma explicação muito prosaica: esse tipo de personalidade se caracteriza por níveis excepcionalmente baixos de vasopressina, um hormônio segregado no momento inicial da relação, junto com a oxitocina, causadora do bem-estar que o apego provoca. Essa substância é que desencadeia os sentimentos de fidelidade, coesão e confiança, três pilares sobre os quais se assenta o desejo de que uma relação perdure, e no caso desses sedutores ela se encontra em níveis mínimos.
Segundo a descrição de Manuel de Juan, o amor tem três etapas: uma primeira de atração amorosa, não necessariamente sexual; outra de paixão, e uma terceira de apego e comprometimento. E o que o Don Juan vive é esse amor lúdico já descrito por Aristóteles. Entende a primeira etapa como uma espécie de rapina. Só ativa a fase seguinte quando percebe que a outra pessoa está apaixonada. Esses indivíduos vivem intensamente os momentos iniciais: produzem mais dopamina e noradrenalina do que o normal e sentem o chute bioquímico do amor com mais intensidade que os demais. Isto lhes produz uma espécie de embotamento rápido, o que os especialistas chamam “saturação do estímulo”, fazendo com que rapidamente se desinteressem e passem a procurar uma nova presa que os sacie outra vez. Seja qual for a explicação psicológica ou analítica que se queira dar a esse comportamento, o que está claro é que tais pessoas sofrem uma disfunção hormonal que as deixa sempre às portas do “verdadeiro amor”, se assim entendermos o amor duradouro.
O Don Juan é, portanto, um viciado. Excita-se com esse coquetel de endorfinas segregado no início da relação – uma vertigem que acaba com a mesma rapidez com que surge. Pode se apaixonar em poucas horas e se cansar no dia seguinte, ou em semanas. Mas não muito mais: o tempo necessário para que seu organismo pare de segregar opiáceos e seu nível hormonal se equilibre. Então, Don Juan, ou Dona Joana, como todo viciado, sai de novo em busca de mais uma dose. No seu caso, de amor."


Desenho de Gorka Olmo. 
POSFÁCIO (ANDO):
O contributo explicativo hormonal e farmacológico, acarreta em si uma exequibilidade fácil ...!
E o contributo explicativo psicanalítico ? Exequibilidade eficaz mas de difícil 
acesso com muitos obstáculos na sensibilização de consciências ...! 
E não dá jeito ...!

A arma, contra o juanismo, é ter um frasco de antídoto no local de trabalho, 
em casa, nas ruas, na cama, nas fortuitidades ...! 
O poderoso antídoto contra o veneno do juanismo é a nobreza do carácter, 
é a verticalidade sustentada da personalidade ...!
A arma é gente completa, madura, regida pela imagem ética e estética.
Gente que não sabe maquilhagens de persona.
Gente que rejeita maquilhagens de persona.
Gente que repele maquilhagens de persona.
São armas.

Um Don Juan é um aflito a procurar, desesperadamente, ancoradouro, mãe.
É um aflito a fugir, desesperadamente, da ebulição das marés, da sua mãe.
Namorou o pai.
Anima-se e aninha-se (mentalmente inconsciente) com o homem.

Suga e suga-se nos aromas das masculinidades.
Vibra nas virilidades que não são suas.
Quando puder ter acesso à vontade ... fica HOMEM, bicha ou o que for de facto,
mas abandonando as pérfidas necessidades de oportunista, 
de incompletude, deixa de ser incubado e de andar travestido de narcisismo psicopático:
esconder-se-á menos, enfeitar-se-á menos e será (quase) mais GENTE.

Edição: Paulo Passos.
Fonte de imagens: internet.



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