domingo, 18 de julho de 2021

CAFÉ COM LETRAS - TEREZA BEZERRA



TEREZA BEZERRA
(Janiel, RN/Brasil)


Tereza tinha dois metros e dezanove centímetros. 
Era filha do major Pequeno.
O major pequeno não tinha nada de pequeno, além dos colhões.
Diziam por aí que o major não fazia sexo, pela pequenez do material.

Tereza andava acompanhada de três empregados que tinham que a segurar quando ela ia discursar no palanque do pai prefeito. 
Tereza prometia construir uma ponte para tirar o lixo na terra, e a mesma ponte poderia servir como um ponto para as pessoas fazerem auto-eutanásia, e claro... um mirante de namoro.
O major não gostava muito, mas o povo estava gostando das ideias de Tereza.
O major resmungava essa juventude.

É papai... fazer o quê? 
Sonhar, já que as pessoas não querem namorar comigo. 
No meu tempo existia o caminho na perdição.
O que é isso papai?
São os pelos dos machos que formam uma linha que vai do peito até às partes.
Hoje os pentelhos são lixo.
As pessoas estão parecendo um toucinho de porco.
 
Tudo morre de medo de sol, a genética humana vai virar uma gelatina.
Tudo branquelo.
Tu achas papai? 
Claro minha filha. 
Quando se constrói é preciso sol para secar.
E ossos que estão toda hora molhados, aí é que precisa de sol.
Papai, que conceitos tão concretos são esses?

Porque é que o único remédio que Theodor passa para mim é um paracetamol e, mais raramente, um ibuprofeno? 
Eu já falei pra ele que os estudos dele se resumem nesses dois medicamentos.
E aquela jaleca dele, com aqueles negócios pendurados, parece até um boi com chocalho pendurado. 
Mamãe era mais doutora que ele.
Tinha a sua horta e o seu gilete para arrancar os tumores em nós.
Nem fale, minha filha.
O último que mamãe tirou em mim já tinha 23 anos.
Foram cinco homens para me segurar e ainda me pegaram na hora no almoço.

Tereza, tu estás com o bucho crescendo de mais, mulher. 
Tu pegaste um bucho.
Papai, eu nunca namorei, a não ser as panelas, e as mamadeiras de leite, que tu ainda tomas, com essa idade. 
Por isso que os homens não te querem.
Papai, o senhor está-me expulsando de casa, para viver sozinho? 
Não, minha filha, só te fiz uma pergunta.
Bem que queria ter um neto aqui connosco.
É papai? 
Pelos visto vai ser difícil.
Os homens estão todos indo para ginásios para deixar a bunda dura e nada de evoluir o negócio. 
Só os braços é que engrossam.

Eu falei que tu não estás normal, Tereza.
Vou levar-te para Theodor te consultar.
Vou tomar um chá de boldo papai e mascar uma morcela para passar esse mal estar e essa barriga inchada.
Toma e chama os meninos para irem contigo ao Theodor, que isso pode ser algum mais grave, pode ser um bucho da água.
Marlete morreu de bucho inchado papai.
Eu sei minha filha e é por isso que tens que te cuidar.

A filha do major está chegando.
Quem? 
Tereza perna de pau.
Aquilo está mais para um circo que para uma pessoa.
Theodor está?
Não.
Só que está é a enfermeira Francineide.
O que foi minha filha? 
É porque papai pediu para me consultar com Theodor, que eu estou meia má, com a barriga inchando e os peitos também.
Estás sentindo enjoou, também? 
Gosto que tu, Francineide, e o Theodor trabalhem na linha de dois.

Venha cá minha filha, vá no banheiro e faça xixi.
O que é xixi?
Mijar.
E você fala xixi?
É, eu aprendi na escola.
Faça xixi e traga aqui, que vou fazer um teste.

Já descobri o seu problema, você não tem nada de doença, Tereza, você pegou foi um bucho.
Você está dizendo que eu sou do mundo?
Socorro, eu não coisei com ninguém não, nunca. 
Tereza eu não estou dizendo que você coisou com ninguém não, mas o teste deu positivo e você está com os sintomas de uma mulher grávida.
E a pessoa pega um bucho sem coisar?
Claro que sim Tereza.
Tem mulheres que pegam o negócio que o homem coloca no negócio para evitar fazer menino.
Ao depois despeja dentro no negócio dela, e aí a mulher engravida.
Eu não fiz isso não.
Tem mais algum jeito?
Tem sim Tereza, você pode ter usado um banheiro e alguém ter deixado leite macho e você tenha tido contacto.
Menina, como tu sois sabida.
Theodor deve saber nada disso.
Se eu peguei um bucho não é meu. 
Entrou de atrevido e é um bucho emprestado.
Se tu não quiseres eu crio.
E o menino vai ser jogado de um lado pra outro? 
Já basta ter ficado no banheiro sozinho.
Pronto Tereza, está tudo resolvido.
Você não tem doença nenhuma.
É só esperar para ele ou ela vir ao mundo, que você já recebeu esse sortudo.
Bota sorte nessa criação do homem.

Papai peguei um bucho do banheiro.
Como assim, minha filha?
Não sei.
Francineide, a enfermeira, é que falou.
Ela é muito sabida, perguntou se eu tinha coisado, ou se eu tinha ido para o laboratório.
Eu não fiz nada disto como tu sabe.
Aí ela disse que foi algum homem que coisou o leite para fora e eu devo ter sentado em cima.
Aí peguei um bucho.
Não tem problema, minha filha, quando nascer nós descobrimos o pai, e aí tu casas.
Eu casar? 
Deus me livre, meu pai.
Já basta o filho para criar.
Tu não queres casar Tereza?
Não, papai.
Tens que casar para cuidar do teu filho.
E tu vais cuidar, não?
Vou sim, Tereza, mas pai é pai e mãe é mãe.
Nada disso meu pai. 
O importante é amar e cuidar, não importa se é um casal ou um trio, ou outra coisa qualquer.
O amor é a extensão do cuidar.

Vamos esperar que nasça.
Se tiver a cara de alguém daqui, eu vou fazer ele, pelo menos, registar essa criança.
E tu estás desconfiado de alguém?
Claro que sim, é de alguém daqui de casa.
Pode ser até meu, que eu também tenho leite.

Tomara que seja dos meninos que cuidam de ti.
Vou preparar um quarto pra tu parires.
Nada dessas frescuras, tudo que entra sai, papai.

Planeje a vida, não as cagadas da vida.
Fico tão desorientada quando não cago diariamente.
Claro minha filha, a merda desonera, que é para o corpo expulsar com mais facilidade.
Tu, Tereza, não tens dificuldade, só adormeces depois de tomares dois litros de leite morninho, numa garrafa pet.
E o senhor que só toma refrigerantes? 
É para ter as garrafas pra tu tomares o teu leite.
Papai, quando o senhor for na Serra do Sol, traga dois bicos.
O que eu tenho está todo mastigado.



Edição: Paulo Passos