quinta-feira, 16 de março de 2017

SUSTENTO DA ALMA - LETRAS DE JOSÉ RÉGIO

José Régio, 1901 - 1969 / Portugal. Fonte da imagem: internet.
"(...)Só a minha memória, trabalhando depois sobre eles, pede à imaginação que lhes dê sentido(...)".
José Régio


Havia um tal de Lápis Azul ... carrasco da liberdade e da criatividade ...

Havia um tal de Lápis Azul ... amante da mesquinhez, da castração e dos pérfidos costumes valorizados e enfiados nas mentes da portugalidade ...

Havia um tal de Lápis Azul ... que proibia o homem se o ser ...

Havia um tal de Lápis Azul ... que escondia a verdade ...  

Havia um tal de Lápis Azul ...  que mentia e odiava como um cão raivoso ...

Havia um tal de Lápis Azul ... exibindo um lustro de paranóia e desconfiança ...


Havia um tal de Lápis Azul ... tão autoritário na própria inferioridade, traduzindo as pérfidas farpas da castração ... 

Havia um tal de Lápis Azul ... que era o censurador oficial do fascismo do Estado Novo Português (1926-1974).

A liberdade era o demónio que as hostes políticas e institucionais temiam, por temerem as suas próprias e promiscuas interioridades.
A corja era de tal modo impiedosa que, tanto estavam enfiados com os focinhos debaixo das saias dos padres, como estavam a mortalhar meia dúzia de desgraçados, só para alimento das suas insanas desconfianças.

Diferença entre estes montes de merda ditadores e os assassinos viventes nos círculos do império romano... tende para zero.

Momentos da história abonados por miseráveis enformadores informativos ... império romano, inquisição, ditaduras, holocaustos, ... enterram as origens na imaturidade das populações e nos escombros dos desaires psicológicos (feitos doença) dos protagonistas em cena ...

Pois foi ... o notável José Régio foi um destes ilustres que sofreu na pele a vergonha da censura, aliás, como muitos outros ainda a sentem, ainda que os formatos sejam ligeiramente mais polidos e manifestos de forma reptícia (não vá o diabo tecelas...!!!) ... é que: quem tem cu tem medo...
Corja de cobardolas, fingidos, cínicos, parasitas, ladrões, corruptos...!

O Jogo da Cabra Cega, de José Régio, um presente tratado de Psicologia, foi humilhado perante a ignorância, prevalecendo os montes de entulho que a protegiam, em detrimento do categórico e elevadíssimo texto, englobador, feito romance ... 

São o medo, a inveja e a falsidade...o eterno medo, a eterna inveja e a eterna falsidade, que fazem mover os tinhosos ...!


"(...) sustento que não há ligação profunda, mesmo entre indivíduos do mesmo sexo ou entre um ser humano e Deus, sim, até no amor místico como tantas vezes os místicos no-lo revelam, que não implique, não envolva, a natureza física do homem: a sua animalidade (...)"
                                                                                                                                                 José Régio


Sobre a vida...sentida, cognitivada e narrada ... para quem sabe ler.

Notável fonte de análise e de auto-análise ... aprendamos a ler e o respeito e, 
quem sabe, também seremos (gente).


ESTAÇÃO TÉRMINO
(José Régio)

Como um navio no mar
A meio da noite a casa,
E o vento e a chuva em redor.
Lá dentro, a um canto do lar
Onde um bom tronco se abrasa,
O homem sentado espera.
Se alguém chegar,
Terá luz, terá calor.
Batem à porta. Quem dera 
Que fosse realidade!
Já teve tais decepções
O homem que há tanto espera!
Mas agora, alguém batera
Que chega de tempestade,
Que percorreu solidões...
"Entre quem é!" Pode ser
Alguém que venha roubar,
Assassinar, ofender...
"Entre quem é!" Não importa.
Se alguém vem que bate à porta,
O homem só pode abrir.
Chegou, por fim, a saber
Que, venha lá quem vier,
Seja quem for,
Só um dos dois pode ser
Desde que não a fingir:
A Morte, o Amor.


Edição de Paulo Passos



segunda-feira, 13 de março de 2017

CAFÉ COM LETRAS - MONÓLOGO


VOO SEM ASAS
 (Janiel Martins, RN/Brasil)

As palavras já não têm prazer
Em serem ditas
Ou citadas
Só o silêncio corre o ar

O chão já não é pisável
É goma pegajosa
Já não há direcções
O horizonte é a escuridão
Sem contornos nas belas curvas

A alegria tornou-se apenas em um sorriso
Que contrai o ar
Serás tu a recompensar
De o respirar novamente

O equilíbrio faz-se manter
Na corda bamba
Com o teu sorriso
Poluindo o ar
Faz-se manter vivo


THE ANSWER
   (Janiel Martins, RN/Brasil)

Não é o sorriso que polui
É o amor que te não trai
És vivo porque te tens
Na certa porque me tens

Assim será
Assim deverá ser o sermos

Sem enguiços da ferrugem
Lubrificados com o odor
Odor que de nós jorra
Enquanto o ar se afasta
Para que nos recebamos
Luxuriados pelos olhares
Os sentires aspirados
Os desejos tornados assim
Giganteados ao tesão de nós

Não é o sorriso que polui
É o amor que te trás
É o amor que se ancora
Em ti que és porto
Alvoraçando o meu


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Edição de Paulo Passos