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Luiz Pacheco. Fonte da imagem: internet. |
Em: O CROCODILO QUE VOA
(Entrevista a Luiz Pacheco, Portugal)
Entrevistador:
O Truman Capote disse: "Sou um alcoólico, sou um drogado, sou um homossexual,
sou um génio." Aplica-se a si?
Luiz Pacheco:
Acho que o génio está muito fora do sítio.
Isto não é modéstia, que seria vaidade neste caso, não é?
Mas é preciso ver que a minha obra é curta, este livro está assim
porque está cheio de textos que não são meus.
Acho que é melhor escrever pouco do que escrever por avença.
(Excerto da entrevista)
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Paulo Passos
PARA-DEUSES
(Paulo Passos, Portugal)
Mais um tísico escarro para o rol
dos maus tratos à igualdade.
Porquê e para quê, PARA-OLIMPÍADAS?
Para demonstrar aos consagrados perfeitinhos que o são?
Para aumentar o tesão nas gloriosas vitórias?
Para que cada medalha seja um invejável duradouro orgasmo?
Ou, tão camufladamente só, para evidenciar
a menoridade e a moralidade, balizadas socialmente,
de quem tem que assumir a tatuagem de algum tipo
de handicap Físico e/ou Sensorial (e não sei, se Mental)?
Enaltecendo, em alívio, quem não os tem!
Alternativas?
As únicas. As justas e de IGUAL.
O empate com a igualdade.
Numa mesma modalidade desportiva olímpica
competem mulheres e homens?
O pequeno do tiro, faz salto em altura?
A moça das cambalhotas, nada mariposa?
O rapaz das corridas, lança martelo?
A criatura das argolas, esgrima?
Os que andam aos rebolões (diz-se "luta")
uns com os outros, são maratonistas?
Claro que NÃO ...!!!
Nos Jogos Olímpicos, a moça das cambalhotas apenas compete
com outras moças das cambalhotas.
E o pequeno dos discos (os discóbolos, entenda-se!) só compete, e muito bem,
com outros pequenos dos discos. Não vai competir com as pequenas.
Assim ... e sem querer atrapalhar ... porque não
compete o moço que desvia o olho, ou a moça cadeirante,
com outros de igual, na mesma modalidade e nas mesmas Olimpíadas?
Tem que ser nas Para-Olimpíadas ... NÃO É?
Segregação travestida de quê?
Entra, no Olimpódromo, o bloco das purezas.
E depois, no PARA-OLIMPÓDROMO, entra o bloco das impurezas.
Futebolistas com danças de salão.
Alternativas?
As únicas. As justas e de IGUAL.
O empate com a igualdade.
Fasquias em concordância com os contextos.
Tempos conjugados com os desempenhos.
Géneros e feitios de corpo consonantes.
Modalidades adaptadas.
Por igual em campo.
Homens adversariando Homens.
Mulheres adversariando Mulheres.
Gente adversariando Gente.
Deuses adversariando Deuses.
No Olimpódromo.
Não em Terreiro Para-Olimpódromo ou Para-Deusódromo.
Nas máximas competências e desempenhos.
No Olimpo que é de todos os de honra.
Como igualdade incutida nos postulados olímpicos.
Jogam, participada e competitivamente, na igualdade.
No tempo e no mesmo Olímpico ringue.
Ringue Para-Olímpico é ringue menor.
Menor e entrevadamente desigual.
Preconceituosamente discriminatório.
Lucrativamente inferior.
Contudo, existindo, mascara a desigualdade,
finge a igualdade, camufla a discriminação.
E o sorridente POVO em comoção ...!!!
Alternativas?
As únicas. As justas e de IGUAL.
O empate com a igualdade.
Mas, em razão mundanamente empresarial ... o que interessa isso?
O que importa são os intentos ávidos lucros!
Aquilo que todos dizem ser MUITO feio falar-se,
mas esgadanham-se todos e todas por ele ...
... o DINHEIRO, o DINHEIRO, o DINHEIRO ...!!!
Ou será que o (conveniente) DEFEITO não pode estar a par
da construída perfeição e idealização dos Deuses do Olimpo?
Ah ... se calhar não existem Deuses menores!!! É isso!!! Não existem!!!
Se existissem ... seriam os Para-Deuses.
Onde algum enxergaria mal, outro atiraria a bola com a boca e outro mancaria à esquerda.
Vá lá! ... Já não é mau de todo ... nas Olimpíadas,
não estarem apenas os Deuses Homens Heteros Caucasianos...!!!
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Frederico Lourenço. Fonte da imagem: internet.
O GAY DISCRETO
(Frederico Lourenço, Portugal)
O gay discreto é tão discreto que nem a própria mulher, de quem teve quatro filhos,
alguma vez lhe descobriu a sexualidade.
Frequenta as áreas de serviço, os centros comerciais e as dunas onde os gays casados
costumam engatar; de vez em quando, de óculos escuros e de chapéu
enfiado pela cabeça abaixo, lá se atreve a entrar numa sauna, onde sabe que terá "saída"
garantida, pois nada é tão afrodisíaco para certo tipo de frequentador
do que a vista de uma aliança de casamento.
O seu terror são as idas ao fim-de-semana com toda a família ao Colombo
(ao NorteShopping, ao Fórum Algarve): será que vai encontrar um parceiro
ocasional que o reconhece? Que lhe vai falar? Que o vai chantagear?
Já teve de mudar de número de telemóvel duas vezes
por causa de situações desagradáveis afins.
O gay discreto é tão discreto que até conseguiu não divulgar
a si próprio que é homossexual.
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Paulo Augusto. Fonte da imagem: internet.
AVANT-PREMIÈRE
(Paulo Augusto, RN / Brasil)
Não foi medo que senti
quando você imenso
– era a primeira vez –
me rasgou a blusa
inebriado e tonto.
Eu era virgem
como todo mundo um dia foi
mas isto não vem ao caso.
Fardos pesados,
no canto do muro, tu e eu.
Vislumbrei à luz murcha da tarde
tua fortaleza pontiaguda
e me recordo: meu coração recuou.
Mas juntei minhas forças todas
e num relance lembrei-me
que mamãe sempre dizia:
– Homem é para-mulher,
e mulher é para-homem.
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Cazuza. Fonte da imagem: internet.
BURGUESIA
(Cazuza, RJ / Brasil)
A
burguesia fede
A
burguesia quer ficar rica
Enquanto
houver burguesia
Não
vai haver poesia
A
burguesia não tem charme nem é discreta
Com
suas perucas de cabelos de boneca
A
burguesia quer ser sócia do Country
A
burguesia quer ir a New York fazer compras
Pobre
de mim que vim do seio da burguesia
Sou
rico mas não sou mesquinho
Eu
também cheiro mal
Eu
também cheiro mal
A
burguesia tá acabando com a Barra
Afunda
barcos cheios de crianças
E
dormem tranquilos
E
dormem tranquilos
Os
guardanapos estão sempre limpos
As
empregadas, uniformizadas
São
caboclos querendo ser ingleses
São
caboclos querendo ser ingleses
A
burguesia fede
A
burguesia quer ficar rica
Enquanto
houver burguesia
Não
vai haver poesia
A
burguesia não repara na dor
Da
vendedora de chicletes
A
burguesia só olha pra si
A
burguesia só olha pra si
A
burguesia é a direita, é a guerra
A
burguesia fede
A
burguesia quer ficar rica
Enquanto
houver burguesia
Não
vai haver poesia
As
pessoas vão ver que estão sendo roubadas
Vai
haver uma revolução
Ao
contrário da de 64
O
Brasil é medroso
Vamos
pegar o dinheiro roubado da burguesia
Vamos
pra rua
Vamos
pra rua
Vamos
pra rua
Vamos
pra rua
Pra
rua, pra rua
Vamos
acabar com a burguesia
Vamos
dinamitar a burguesia
Vamos
pôr a burguesia na cadeia
Numa
fazenda de trabalhos forçados
Eu
sou burguês, mas eu sou artista
Estou
do lado do povo, do povo
A
burguesia fede - fede, fede, fede
A
burguesia quer ficar rica
Enquanto
houver burguesia
Não
vai haver poesia
Porcos
num chiqueiro
São
mais dignos que um burguês
Mas
também existe o bom burguês
Que
vive do seu trabalho honestamente
Mas
este quer construir um país
E
não abandoná-lo com uma pasta de dólares
O
bom burguês é como o operário
É
o médico que cobra menos pra quem não tem
E
se interessa por seu povo
Em
seres humanos vivendo como bichos
Tentando
te enforcar na janela do carro
No
sinal, no sinal
No
sinal, no sinal
A
burguesia fede
A
burguesia quer ficar rica
Enquanto
houver burguesia
Não
vai haver poesia
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Janiel Martins
CARNALÍTICA
(Janiel Martins, RN / Brasil)
É de dois em dois anos
Nas ruas
Em todas
Até nos lugares esquecidos
Aparecem eternados
Aterrados
E até internados
Abusados
Prometem empregos e mundos
Sem terem pra dar
Promessas que ficam
Só para o antro
De patrocinadores
Na promessa
Todos vão sair
De casa
Com a fantasia
No corpo
E esfregada na alma
A lambada e o forró
São os ritmos preferidos
Acompanhados de um kit
Não um kit escolar
Mas o esperado
kit pra alma
Uma cachaça
E um refrigerante
Nas ruas o povo
Segue
O idolatrado num ritmo
De crianças de colo
De pescoço
De adolescentes pré alcoolizados
De mulheres de olhares pardos
Homens mistícios
A terceira idade adiante
Segurando a pipoca
O pai alcoolizado
Puxa das mãos da criança
As últimas dessas
Para tomar a sua
Enganosa pingapolítica
Passando pelos homens
Até o saco
Ser jogado na rua
Sem gari
No palco principal
Só olhares
Morto
Não paga promessas
Nem realiza
Até os próximos
Ressuscitados.
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Janiel Martins |