MEIO
(Janiel Martins, RN/Brasil)
Somos tontos
Procurando
Um lado
Esse lado existe?
O importante
É que este lado
Não
Esteja vazio
Mas há a cegueira
O blogue – Comer e Saber – apresenta-se com o intuito de exterminar amarras. Impera-se em três rubricas: Sustento da Alma; Café com Letras; Gastronomia e Culinária, como ferramentas de promoção e fomentação de liberdades e pluralidades. Movimenta-se na consciencialização da noção de direito às criatividades, no débito da conjugação dos intrínsecos conceitos de SABER (enquanto fonte de SABOR) e o de SABER (enquanto fonte de CONHECIMENTO).
MEIO
(Janiel Martins, RN/Brasil)
Somos tontos
Procurando
Um lado
Esse lado existe?
O importante
É que este lado
Não
Esteja vazio
Mas há a cegueira
PORTO SANTO II
(Janiel Martins, RN/Brasil)
O Porto Santo...
... é belo e tão delicado
Tão delicado...
... como a fumaça...
... do pensamento
Aqui...
... não tem demónios
Só tem leveza
De irmãos...
... trouxe...
... uma fragância
E o Porto Santo expulsou...
... os demónios
O Porto Santo...
... é um belo útero
Deste que me entendo por ser vivo que tenho medo.
O medo é o nosso cérebro suicidando os bichos pequeninhos, que estão dentro da nossa matéria.
É uma reacção.
Eu acho que queima e o pensamento deve ser a fumaça.
Deve ser porque o pensamento é tão leve e friozinho, chega a dar coceguinha no coração.
O estômago queima a comida que comemos e o cérebro deve ser uma peça que esfria o sangue, se não o sangue iria ferver muito.
O sangue é constituído por nutrientes da comida.
É meio podre, sei lá...
O Porto é Santo
Não deixa os demónios te dominarem
O Porto é Santo
É o filho que os pais fazem questão
De falar para os amigos
O meu filho é diferente
O Porto é Santo
Tem delicadeza peculiar do restante Portugal
Como se poesia
Florbela Espanca
UM FOGUETE
(Janiel Martrins, RN/Brasil)
Nesta terra
Para onde fui lançado
Há fome
Há tristeza
A sujeira
Não é material
Há sujeira
(Senti)mental
Oh homem
Porque paraste de pensar?
Reconheça
Que é dopamina
Corpo
É uma infecção
De infantilidade
Reconheça
Que é apenas
Uma infecção
De piedade
Infantil
Não tenho defesas
As infecções
Só antibióticos
NÃO HÁ ARMAS
(Janiel Martins, RN/Brasil)
As paixões são venenosas
É uma parte alheia
O narcisismo é seco
Não vou criar armas
Que se fodam os meus pobres sentimentos
Que se fodam?
MERGULHANDO NO VÁCUO
(Janiel Martins, RN/Brasil)
Mergulhei num abismo onde o medo não existe.
Só sinto o sangue escorrendo no pobre coração que um dia faltará.
Fico triste.
Estás falando só, doida?
Estou pensado.
A vida é a resistência de viver e não podemos parar.
Viver o quê, doida?
O tempo é uma solidão.
As cobras são engraçadas. Só dormem e caçam.
Acho que vou ser uma como uma cobra.
O que as cobras pensaram para evoluir e chegar a este corpo, Francivaldo?
É mesmo! Devem ter pensado a vida é uma foda.
Lá vens tu com as fodas, Francivaldo!
Assim disse Jesus Cristo. Dai de comer e de beber, a quem tem fome e a quem tenha sede.
A fome não é só de pão, doida, a forme também é da carne.
Faz sentido, Francivaldo.
Olha doida, o pé do menino que Deus esqueceu aqui fora.
Vixe... que pé bonito.
Deixa eu colocar ele dentro de tu, pra nós trazer outra vida?
Larga com isto, Francivaldo.
ESQUECIMENTO DE DEUS
(Janiel Martins, RN/Brasil)
Gosto do cheiro das plantas
Gosto da fome
Do cheiro da fome de viver
Gosto de olhar o pé de menino
Que Deus esqueceu aqui dentro.
BURACO DE PAREDE IV
... Quatro dias depois
Minha mãe, eu vim pegar minhas roupa.
Vá logo minha filha, que o seu pai é muito ignorante, se ele chegar aqui vai falar besteira.
E essa cara labida veio aqui fazer o quê?, Não está bom na casa do seu macho?
Fale assim com a menina, não.
Você também quer ir embora? Vá com ela.
Deixe de ser bruto homem, nem os animais são assim...resmunga, resmunga com tu mesmo.
Vá minha filha.
Um dia eu volto para visitar a senhora e meu pai.
Volte quando a poeira baixar minha filha, e nunca deixe os outros pisar em você.
O caminho não volta para nós.
(A separação para o ser humano é bruta. O ser humano não foi preparado para a separação.)
Terezinha eu vou para São Paulo
Vá não, Josivaldo, São Paulo é muito longe, eu vou ficar com saudades de tu, assim como aquela estrela tem das outras amigas delas. As estrelas, pelo menos, elas avistam umas às outras e se tu for eu nem vou ver tu.
Eu vou porque eu quero uma vida melhor para nós.
O meu coração murcha, quando tu fala que vai embora. Dá um frio dentro do meu peito e o meu peito só tem um namorado.
E tu tem outro namorado, Terezinha?
O namorado do nosso peito é o nosso coração, ninguém entra dentro do nosso corpo. O namorado do corpo é o nosso espelho, é a sua proteção. Dentro de nós não precisamos de companhia, Só da nossa natureza, imagina só a tristeza de uma estrela.
Dizem que Dalva não é uma estrela, é um planeta.
Cada estrela tem um bocado de filho, e Dalva é iluminada pelo nossa estrela que chamamos de Sol, e as estrelas para não viverem só, têm os planetas que vivem os arrodeando.
E a lua é o quê?
A lâmpada da terra.
É Terezinha?
Não sei não, só sei que a minha imaginação pensa assim, e como nós não podemos ficar com muita coisa no miolo da cabeça, eu acredito na minha imaginação.
Dizem que é bom plantar quando a lua está nova, que joga toda a força para a terra e deita a galinha para nascer na força da lua, para os ovos quebrar melhor.
Eu fico com o meu juízo tremendo quando a lua está cheia.
É Terezinha?
É sim, tenho um sentimento de inveja, com tristeza de não o conhecer o mundo, quando a lua está grandona.
Serra das Tapuias, 2002
(O silêncio permaneceu durante todo o dia, a lua nasceu bem cedinho, ninguém comeu, o barulho do carro de Dede, veio como o chorro)
Olha...
(a sacolinha com os teus documentos, não foi falado, a mão foi estendida)
Fechei a cabeça, sem deixar sair lagrimas, fechei, deitei sem mesmo ter forças para fechar a porta. Não tive medo, pois naquela noite já não existia sentimentos, acordei com um frio no peito que não era aquecido com café. Tinha perdido os sentimentos todos. Fiquei como uma estrela, solitária. Preferi ficar na cama mais um dia e uma noite. A morte doera menos. Hoje eu sou a estrela Dalva.