domingo, 16 de fevereiro de 2025

CAFÉ COM LETRAS - TROCAR O PÉ POR UM PÉ DE BOI (I)



Publicado, originalmente, em Psicologia.pt a: 2019-04-21 

http://www.psicologia.pt/artigosher cronica.php?trocar-o-pe-por-um-pe-de­boi&codigo=CR0031

Paulo Passos 

Psicólogo clínico, Braga/Portugal

"Eleutéria era, também de corpo, um mau feitio.

Tinha uma linha que a seguia de cima a baixo, sem necessidade de cumprir quaisquer curvas, mas quando a medida era tirada de perfil, a linha contornante do seu corpo já exibia grandes lombas para a diante.


Tudo isto, adicionado ao seu tamanho, que não ia além de um metro e pouco, construía um panorama que implicava comentários com ou sem graça, consoante os gostos e as intencionais aventuras.

Agravava tudo com o carnaval que punha em cima de si.

Estava com um fato de banho de perna, amarelo e azul-claro às riscas horizontais.

Vários colares garridos saíam-lhe pelo pescoço, a contornarem o seu grande e sustentado par de mamas, terminando suspensos e a abanar por toda ela, que rivalizava com uma montra de bugiganga barata, com o produto todo amontoado.

Usava uma touca na cabeça, de borracha amarela com flores cor-de-rosa, que abanavam com os movimentos, por serem fixas apenas ao meio.

Na areia ou na água, nunca aquela touca saía.

Quando ia ao mar, a água não lhe subia mais que meia perna. Tinha medo e as ondas faziam-lhe cócegas provocantes.

Molhava-se, apenas no rescaldo da onda, baixando-se e salpicando o corpo com uma mão, enquanto se apoiava na neta Glória Micaela (indiscutivelmente chamada de Glórinha, tanto pela fragilidade do corpo, como pelo cariz nervoso e trémulo com que a criatura se apresentava), para se manter equilibrada.

As alças do fato de banho, muito vincadas nos ombros, pela cedência da camada gorda que lhe forrava o corpo, contrastavam com o vermelho vivo, já em ferida, da pele queimada do sol.

Independentemente da temperatura da água e das condições do mar, os gritos e gargalhadas eram intermináveis, durante todo o tempo que lá estivesse."


CAFÉ COM LETRAS - AS COBRAS


AS COBRAS

(Janiel Martins, RN/Brasil)

As cobras devem dizer assim (desculpa: devem pensar assim):
Ai que fome... vou caçar. Vou-me enfartar e depois vou dormir e dormir, até dar fome novamente.
É engraçado como as cobras conseguiram produzir veneno para se protegerem.
Elas devem pensar muito.
Estás a perguntar a eu?
Não. Estou pensando com o espírito de cobra.
Os pulmões fazem cosquinhas e eu gosto da leveza do pensamento.

domingo, 9 de fevereiro de 2025

CAFÉ COM LETRAS - ÀS VEZES



ÀS VEZES

(Janiel Martins, RN/Brasil)


... sinto vontade de cair

num abismo

... seria bom

viver flutuando

... não sentir o peso

da terra.

domingo, 2 de fevereiro de 2025

SUSTENTO DA ALMA - CACAREJO É CORO

 

Em: https://sai-qolo-gi.blogspot.com/2025/01/cacarejo-e-coro.html

Paulo Passos, psicólogo.

Braga / Portugal

    "No pujante provincianismo (em modo tuga... está de se ver!) alimentam-se os tradicionais urbanismos (e os outros... que são sub e também rurais) alarmantes (como convém), sobre uma dôr que, porque televisiva (de contornos de espetacularidade), debuta-se, num sofrido colorido que (travestindo uma falsa união) se impões (como se desígnio civilizado e balizado em determinismos de rigor e de plausível sustentação), favorecendo o hastear (com sentido de Estado... já se sabe!) das bandeirinhas e bandeirolas de bairro e de associações, num glorioso formato de crença, palidez e opinião, motivados por orgulhosas (domésticas) despertenças... quase históricas.

    Tamanha é a idealização da convicção que o optimismo (e voluntarismo) se transforma numa quase-coesa (não fosse o infantilismo) invasão nacional, mas... azar dos azares, o mundo começa e acaba no bairro...!

    ... Jeremias desencanta-se (em repeat) com o sonoro feitio de alma (e de corpo embaciado, mas empolgante e cacarejante, de Priscila Manuela, rondando (quase) a felicidade e exaltação, numa sedução foleira comandada pela ansia do seu nulo ego (modo masturbatório de saia rodada... ainda que incapaz e de flacidez orgástica).

    Priscila Manuela, baixota (em quase excesso) mas entusiasmada em desmedida e escondendo a sólida aptidão para a pequenez, que a faz, aprecia-se e salienta a própria satisfação, num cenário de, para quem a visse, moça segura na determinação dos seus avantajados atributos peitorais e proeminência das grossas coxas.

    Priscila Manuela desdobra-se de modo a demonstrar a quanta (aparente, tonta e delirante) importância (como ela quereria sentir) e nobre (como que imprescindível vitalização da institucionalidade nacional) atributos que não lhes eram.

    ... Jeremias raspou-se... de fininho..."

 

domingo, 26 de janeiro de 2025

CAFÉ COM LETRAS - CHUVA DE PEDRA



CHUVA DE PEDRA
(Janiel Martins, RN/Brasil)

Lá em baixo tem um mundo onde chovem pedras. 
Mas, de tantas que caíram, se acalmaram. 
É um mundo onde o pensamento pára. 
Dá um desengano pensar que as pedras não pensam. 
Dá uma dor no peito. 

 (... devo alimentar a imaginação de uma forma a não pensar. Gosto de sentir a cosquinha da queda livre...)

Lá em baixo tem monstros e paz. 
Quando cai uma pedra todos correm. 
E falam: uauu ...!!!


domingo, 19 de janeiro de 2025

CAFÉ COM LETRAS - O CANTO DO CANTO

 
O CANTO DO CANTO
(Janiel Martins, RN/Brasil)

Canto para o canto
Canto de parede
Céu sem estrelas

Estrela... tu deixas-me triste
Tu fazes-me entender
Que sou tão pequeno

Tenho medo de alturas
Não tenho medo da morte
Porque acho
Que vou cair no céu
E me perguntar (?)
De onde eu vim

Será que eu vim
Dalgum pontinho de luz

Espero não saber
E espero não ser uma bactéria
Ficarei triste
Se souber

Prefiro 
Prefiro ser um desconhecido
Por favor
Por favor... não sou uma bactéria grande
Eu vim dos colhões do meu pai

Assim antecedendo...

domingo, 22 de dezembro de 2024

CAFÉ COM LETRAS - O MUNDO LÁ DE BAIXO



Lá em baixo tem um mundo onde chovem pedras. 
Mas, de tantas que caíram, se acalmaram. 
É um mundo onde o pensamento pára. 
Dá um desengano pensar que as pedras não pensam. 
Dá uma dor no peito. 

 (... devo alimentar a imaginação de uma forma a não de pensar. Gosto de sentir a cosquinha da queda livre ...)

Lá em baixo tem monstros e paz. 
Quando cai uma pedra todos correm. 
E falam: uauu ...!!!


domingo, 8 de dezembro de 2024

SUSTENTO DA ALMA - FAMÍLIA OU DOMESTICAÇÃO DA INFÂNCIA? (II)


Texto original de Paulo Passos

Em: https://sai-qolo-gi.blogspot.com/2020/07/familia-ou-domesticacao-da-infancia.html

    Justificativamente, apontam-se determinismos ligados à elevada incidência de sintomatologia de desajuste na infância (considerando e incluindo os sinais e sintomas de natureza ansiosa e/ou depressiva).

Salientam-se, sobretudo e etiopatogenicamente, os determinismos históricos, sócio-culturais e familiares, onde a significância de valores (ainda que adversos ao desenvolvimento justo e livre) são incidentes e enraizados nos contextos de validação clínica/disfuncional/patológica.

No concernente à cidadania e às estratégias interventivas, sugere-se que o recurso a práticas sustentadas (e fundamentadas nos devidos apriorismos e rigores de direito) de continuidade e promotoras da implicação de realidades ambientais, sejam as de eleição, considerando a excelência de oportunidades na adesão em âmbito da saúde (ambiental, comunitária, grupal/familiar e individual) desprovida da função de condicionamento ou de domesticação.

 

    O Chefe-de Família e a Dona-de-Casa:

Neste modelo inter-activo, e no que concerne à criança, não são cumpridas as necessidades de satisfação/gratificação da liberdade e do direito existencial, na sua esfera promotora de integração, adaptação e de participação implicada e construtiva.

Neste registo, recai sobre a criança a exigência de funcionalidade com caracterizações (de imposição) de natureza histórica, institucional, política, económica, social, cultural e familiar, em detrimento da existência centrada na realidade (actualizada e actualizante) da infância.

Estas práticas operam e estão sustentadas (entre outras responsabilidades) em posições feudais na paisagem familiar e sócio-cultural.

Na demonstração deste, a despromover, desígnio (usual e manipulador pró-tirano), estão:

- As práticas relacionais e educativas referentes às lideranças centradas na hierarquia sócio-familiar (treino de subjugação);

- A tendência ao cumprimento de um programa de vida impositivo e pré-existente (auto-desinvestimento, fatalismo e dependência);

- O recurso conveniente à opinião como certeza educativa (invalidação de alternativas); a sujeição às matrizes de valores dominantes (acriticismo);

- A exigência da aceitação passiva de normas (conformismo e adesão acéfala);

- A função de condicionamento como estratégia educativa e relacional (despersonalização do sujeito);

- A segregação da autonomização;

- A inibição da implicação e da estimulação do decisório;

- A castração da responsabilidade e independência;

- A intoxicação da espontaneidade…!

 

    O Pai e a Mãe; o Pai ou a Mãe; os Pais ou as Mães:

Contrariamente ao cenário anterior, neste registo de relacionamento, são debitadas vivências de gratificação onde a incidência recai sobre a criança, por si, com extermínio das caracterizações de conveniência e das crenças das ditaduras das hierarquias sócio-familiares.

Salienta-se, como substracto referencial à mudança, a revisão e renovação de enraizados e acríticos constructos sócio-histórico-culturais, assim como a responsabilização para a pertença e para a integridade ambiental.

São sistemas familiares e culturais promotores de salutar desenvolvimento, onde a matriz da relação entre a criança e o meio cuidador, estão centrados:

- Na qualificação da estimulação afectiva;

- No recurso à naturalidade do desenvolvimento e da interacção;

- Na disponibilidade para a segurança e protecção;

- Nas acessibilidades para a relação em direito e em justiça;

- Na democratização de formatos comunicacionais e de socialização;

- Na confiança ambiental;

- Na implicação harmoniosa, lúdica e integrada da criança no próprio desenvolvimento;

- Na facilitação gradual da construção da noção do outro como parceiro nutritivo;

- Na conjugação e adequação de expectativas;

- Nos procedimentos de participação e de elaboração;

- Na operatividade assertiva, livre e equitativa;

- Na facilitação de experiências de variedade, através do aperfeiçoamento de modelos avaliativos;

- No exercício da função gregária; 

- No treino de alternância com posturas hipotéticas…!

 

    Os Outros:

Este enquadramento espelha as intenções e os desígnios de outrem (de cidadania, profissionais e de institucionalismos de rigor) no panorama (integrado e sustentado em apriorismos de validade) promotor de saúde ambiental, comunitária, grupal, familiar e individual.

A materialização das intenções de maturação dos sistemas (promoção de saúde e prevenção de disfuncionalidades e de patologias) incluem cenários laborais centrados no sujeito, nos manifestos grupais e nos de realidade comunitária.

No que concerne à institucionalidade, esta deve favorecer a possibilidade de se manter actualizado o real cenário das necessidades comunitárias, pela leitura epidemiológica de rigor e, consequentemente, pela construção de programas de benefício comunitário, com fomentação dos próprios recursos das comunidades.

Dentro das práticas de intervenção comunitária, os meios de excelência, são os que consideram a implicação da comunidade como:

- Protagonista;

- Actuante;

- Pensante;

- Crítica;

- Coesa;

- Articulada;

- Influente;

- Capaz de ajustes em auto-regulação e auto-determinação, no sentido dos poderes da coerência da justiça nas equidades e nas liberdades…!

 

  A ditadura (mesmo na sua travestida e corrosiva forma de auto-indulgência) encobre-se com a propaganda e o aplauso.

    Evite-se ou, preferencialmente, extermine-se…!


 

domingo, 1 de dezembro de 2024

SUSTENTO DA ALMA - FAMÍLIA OU DOMESTICAÇÃO DA INFÂNCIA? (I)

 

Texto original de Paulo Passos

Em: https://sai-qolo-gi.blogspot.com/2020/07/familia-ou-domesticacao-da-infancia.html

 

 " Crianças tão domáveis quanto o poder da doença da resignação possa exigir.

    Crianças tão indomáveis quanto o são e prazeroso feitio (de corpo e de alma) determine.

    A subjugação aos dogmatismos relacionais e educacionais pré-definidos, num arcaísmo acrítico, são mecanismos ditatoriais sustentados pela crença e valorização de um banal “bem-feitorismo” (que começa em casa, continua na escola e segue nos meios sociais próximos e alargados…), registado na sua hábil tacanhez de intenções e de competências, enquadrado num cenário impositivo e de intento castrador…! 

    A identificação de práticas de relação (no manifesto ou no determinismo do latente), onde a criança é elemento interveniente, está o motivo do presente texto (*), na sua vertente de inventariação e sistematização dos discursos e das posturas psicológicas que sustentam as variedades dessas (valorizadas) práticas.

A análise de conteúdo dos registos de observação, bem como a interpretação dos significados, atribuídos às modalidades de valorização histórica, social, antropológica e cultural, estão na base dos constructos dos padrões comunicacionais, que se identificaram e deram motivo ao presente texto.

Foram inventariadas expressões, verbalizações de pareceres e relatos de relação (directas ou por tradução clínica), as posturas inerentes às práticas relacionais, bem como os mecanismos de condicionamento, no contexto do cumprimento dos processos (dogmáticos) de influência interactiva.

A estruturação do texto enquadra-se na divisão e saliência (do que inventariado e sistematizado), no quadro das práticas sócio-familiares de interacção, tendo a criança como um dos intervenientes, organizando-se nos seguintes desígnios:

    - Desígnio 1: O Chefe-de Família e a Dona-de-Casa (Contextos domésticos e vulgares de relacionamentos. Tipo de relações com elevado cariz condicionante e patologizante).

    - Desígnio 2: O Pai e a Mãe; o Pai ou a Mãe; os Pais ou as Mães (Clarificação de intenções equilibradas de promoção relacional e existencial).

    - Desígnio 3: Os Outros (Identificação de posicionamentos de intervenção, de responsabilidade institucional e de cidadania, no sentido dos seus intentos sanitários de abrangência ambiental, comunitária, grupal, familiar e individual)."


domingo, 24 de novembro de 2024

SUSTENTO DA ALMA - O PAPELAÇO DA SALA E DA SALA DE AULA



Texto (autoria: Paulo Passos) publicado em: 

https://sai-qolo-gi.blogspot.com/2021/04/o-papelaco-da-sala-e-da-sala-de-aula.html

 

"O massacre (amordaçado) da infância começa na família e é continuado na escola, de forma dedicada, protegida legislativamente, irreversível e infalível.

...ainda que e na presença de...

Tantos talentos sem quaisquer escolarização/formação/academismo formais.

...e... em demonstração...

Raros talentos (em proporção aos milhões de alunos/formandos) com tanta (e mais alguma) escolarização/formação/academismo oficiais...!

Em talentos autodidactas... e noutros didactizados (fartazana) desprovidos de tal.

"(...) na educação da juventude (...) as escolas são consideradas como os espantalhos das crianças, ou as câmaras de tortura das inteligências (...)". Pág. 157, Coménio (1592-1670), "Didáctica Magna", 3ª Edição, Fundação Gulbenkian, Lisboa.

Entre os escolarizados fazedores de coisas (categoria Épsilon em "Admirável Mundo Novo" - Aldous Huxley) e os debitantes de meros determinismos opinativos (enxurrando serviços, agravadamente, quando estes são públicos), está o produto do "trabalho", este vandalizado mas vangloriado e glorificado pelas conveniências da incompetência e da corrupção ética e estética (no mínimo).

...contudo... e em pecado, legislativamente, mortal... 

Insiste-se na escola enquanto modelo sequencial à família, num violento processo de domesticação da infância, onde os sorrisos se materializam na palidez da incompletude e da delinquência aprovada, da acrítica e a-noção, de um patético benfeitorismo patriótico e da plenitude da irresponsbilização.

"(...) perto de ti é difícil pensar, Zé Ninguém. É apenas possível pensar acerca de ti, nunca contigo. Porque tu sufocas qualquer pensamento original. Tal como uma mãe, tu dizes às crianças que exploram o mundo: isso não é próprio para crianças. Como um professor de biologia, dizes: isso não é coisa para bons alunos. O quê, duvidar da teoria dos germes no ar?. Como um professor primário, dizes: as crianças são para ser vistas, e não para se ouvirem. Como uma mulher casada, dizes: hã! a investigação! eu e a tua investigação! Porque é que não vais para um escritório, como toda a gente, ganhar decentemente a tua vida? (*)

"(...) ris-te do Zé Ninguém, sem entender que é de ti que te ris, tal como milhões de outros Zés Ninguéns(...)" (*)

(*) Wilhelm Reich, "Escuta, Zé Ninguém".

 

BY THE WAY... 

Lá pelo século XIX, os franceses invadiram Portugal, por 3 vezes. Na escola pública portuguesa há um capítulo da História, debitado aos alunos, que se chama Invasões Francesas. 

Há um outro capítulo da História, na mesma escola pública portuguesa, igualmente debitado aos alunos, em que os portugueses invadiram o Brasil (e demais) e que se chama Descobrimentos.

O mesmo guião, o mesmo acto... um é Invasão e outro é Descobrimento... (conforme o jeitinho).

The best of tugas...!"