Genuinidade, honra e notabilidade.
Essência.
Essência nordestina.
Essência.
Essência nordestina.
Um conto do Sertão ...
... um conto de Janiel Martins ...
NO MEIO DO TEMPO
(Janiel Martins, RN/Brasil. 2017)
- Mininos venham todos para dentro,
que vamos lá na casa do seu tio Zacarias.
- Fazer o quê, mãe?
- Vamos lá que teu pai mandou chamar
ele para ser padrinho de um dos mininos.
- E vai ser padrinho dos dois, mãe?
- Não, que não pode, meu filho.
- E quem vai ser padrinho do outro?
- Não sei, seu pai que vai chamar outro. Quem
ele quiser. Cuida, vamos tomar banho e ajeitar a carroça para colocar os
meninos, quero ver bem limpinha para não sujar as cobertas. Chega bocado de
peste, embraçar o cabelo, passar perfume e tão tudo direitinho?
- Tamos sim, mainha.
- Se ensaca direito Clodoaldo, tu quer
ficar em casa sozinho?
- Não mãe, eu também vou.
- Eu vou logo avisando, se derem
trabalho é a ultima vez que saio com vocês de casa. E você, Maria, é para olhar
comigo os mininos, entendeu? Lindolfo traga a carroça.
- Tá aqui, mãe.
- Deixa eu ajeitar e vão se comportando
que não quero passar vergonha. Tá tudo fechado! Vamos com Deus e meu Padim
Cíço. Fazia tanto tempo que não saía de casa. Que sensação boa, proteja eu e
meus filhos, meu Padim Cíço. Que bonito! Tudo já crescendo e que venha mais meu
Deus e com muita saúde. Ois troce, para dar trabalho. Se ajeite bocado de peste
ruím.
- Ai mãe, a senhora só dá em mim!
- Claro. Vocês me deixam doida. Na
próxima é você, Lindomar.
- E eu fiz o quê, mãe?
- Não sei, imagino. Que coisa bonita
meu Deus os meus mininos tudo arrumadinho e de sapato, acho bonito demais esse
bocado de meninos e com essas roupinhas com um bocado de cor.
Cosme e Cosmo iam quietinhos. Nem parecia que estavam dentro de um carro
de mão. Na primeira enrolada encontrou-se com a sua prima, que morava no Sítio
Angicos. Fazia algum tempo que não se viam. Olhou para todos os meninos e ficou
perdida.
- E cadê os gêmeos, minha prima, que
eu ouvi dizer que já tinha parido?
- Estão aqui, muié. Não sou de ferro
para carregar no colo. Quando tenho que sair de casa, trago na carroça. É bom
demais, não dá trabalho e é bem maneirinho.
- Mas comadre, como tu sois danada
mesma!
- Vamos andando, que vou lá em
Zacarias e tenho que chegar em casa antes de anoitecer, que esqueci de colocar
a luz e fósforo na porta. Esses mininos me deixam doida. Venha passar um dia
lá em casa, minha prima. Só mande avise antes que mando prender uma galinha para
nós comer no almoço.
- Tá bem, vão com Deus.
- Páre aqui, bocado de peste. Ouviu o
que falei em casa, mas vou repetir aqui de novo. Quero todo mundo quietinho, e
quando eu falar é para obedecer, senão nunca mais saem de casa comigo e quando
chegar lá é para tomar a bênção ao seu tio e a sua tia. Senão Deus castiga. E
tudinho pertinho de mim.
- Ó de casa?
- Ó de fora?
- É Rosa, Zéfinha!
- Ó mulher, vão entrando. Eu tou
tomando banho.
Houve um descontrolo, ânsia e falta de ar.
- Ó bocado de beste ruim, se ajeitem.
Senão vamos embora daqui mesmo e quando chegarem em casa vão tudinho levar uma
surra. Pega em Cosme, Maria, que eu pego em Cosmo. Lindomar, bota a caroça debaixo
do pé de imbú.
- Entra muié. Tava tomando banho.
- A bençã.
- Um de cada vez, meus filhos.
- E como tão os gêmeos? Já escolheu o
nome?
- Já. É Cosmo e Cosme.
- Já tão grandinhos. E é bom mesmo,
colocar nome de santo.
- E cadê Zacarias?
- Tá por aí, no roçado. Daqui a pouco
aparece por aqui.
- E os teus mininos, tão tudo bem Zéfinha?
- Tão, só tava com uma gripe danada,
mais mandei mãe fazer um lambedor e ficaram tudo bom. Se tu quiser dar pró teus
mininos, para evitar pegar essa gripe véia. Pode dar.
- Não Zéfinha, que eu também fiz um, para
evitar pegar essas gripe véia e tou dando todo dia uma colhezinha. E fiz com
cupim, que é bom demais. Minha avó que me ensinou.
- Mãe, posso ir brincar?
Zefinha respondeu
- Deixa eles ir, Rosa.
- Vão, mais com cuidado.
E Rosa continua …
- Zefinha, eu vim aqui chamar, para
tu e Zacarias ser padrinho de um dos mininos, que Benedito mandou eu perguntar.
- Vou perguntar para Zacarias, mas
quero sim. Ó Francivaldo vai chamar o teu pai.
- Pra quê mãe?
- Cuida peste. Vai logo.
- Oi tudo bem, Rosa?
- Tudo.
Zefinha adiantou …
- A Rosa veio aqui saber se agente
quer ser padrinho de um dos mininos.
- Vamos sim, e de qual vai ser?
- Qualquer um. Vamos arrumar outro e
nós ajeita o batizado.
- Tá bom.
Zacarias, orgulhoso, diz para a mulher:
- Muié, bota um café no fogo.
- Já tá pronto.
- Coloque para os mininos, Zefinha e
traga uma copo pra eu. Cuida troce. E cadê Benedito?
- Foi trabalhar, só vem na próxima
semana, se Deus quiser.
- Pois tá.
- Nós tamos indo embora, e quando
tiver mais perto eu mando avisar. Chega pra tomar a bençã ao seu tio e a sua
tia para a gente ir embora. Traga a carroça Lindomar. Até a próxima, se Deus
quiser.
- Vão com Deus.
- Cuida que o sol já tá caindo. Apresse
os passos mininos. Obrigado, meu Padim Ciço, que eles quiseram. Agora é com
Benedito. Ai que falta que você me faz meu véio!
- O que foi mãe?
- Nada não. Espera aí, vão tudinho
para beira da estrada. Meu Deus tá faltando um dos mininos …. Maria Salestina,
Lindomar, Clodoaldo, Cleidebergue, Maria Vitória, Lindolfo, Gerusa. Meu Deus, e
qual que tá faltando? Cosme e Cosmo tão dentro da carroça. Minino, tão tudinho
aí?
- Tamos sim mãe.
- Tem nove, tá certo meu Deus. Não é
que tou ficando doida mesmo?
- Tás doida?
- Toma aqui, peste ruim.
- Eu de novo, mãe?
- Meus Deus, já tá escurinho, e não
sei onde deixei o fósforo e ainda tenho que fazer o fogo para esquentar a
comida e fazer o café.
SERTÃO, TAPUIA 06 de Novembro de 1998
Edição: Paulo Passos |