terça-feira, 5 de setembro de 2017

CAFÉ COM LETRAS - EM HONRA DO TESÃO DO MIJO



Alusões sertanejas.

Outro conto do Sertão ...

... outro conto de Janiel Martins ... 



EM HONRA DO TESÃO DO MIJO
(Janiel Martins, RN / Brasil)

- Minha véia, tem algo de estranho com o nosso Florivaldo.
- Meu véio, o nosso minino é um minino especial.
- Que nada, minha véia, eu sei o que vejo. Não estou ficando doido. Amanhã vou lá no sítio Enxú falar com o meu compadre, para trazer Marluce para vim morar com nós. E tu vais orientar ela e faça com que ela goste de Florivaldo.
- Mas Lorival, tu já não sabe da fama de Marluce?
- É por isso que quero ela aqui com nós, para ver se o nosso minino desencarna logo de uma vez. E não deixe ele ficar de amizade, se não as coisas podem complicar para o nosso lado. Tu sabe como são as pessoas daqui de Catolé.
- Está bem meu Lorival querido.
- Amanhã mesmo vou passar lá, que vou pegar aquela garrota brava que está na Fazenda do Enxú, e já passo lá, na volta. Se compadre aceitar já trago ela junto com a garrota. Não fale nada para o nosso Florivaldo não, para ele não se assustar, tá?

Já na Fazenda do Enxú:

- Ó meu compadre Lorival, como andam as coisas, há quanto tempo que não o vejo, vai desapeiando homem e entra para cá. Ó Marluce, tás mouca filha da puta!
- Estou aqui papai.
- Traga um tamboreto para compadre Lorival. E o meu compadre quer uma água?
 - Não, meu compadre, eu aceito um golinho de café, se tiver e um fósforo. Meu compadre, eu vim aqui para falar com tu para levar Marluce lá para casa, para ajudar com as coisas de casa. A minha véia tá acabada demais, tem andado muito esmorecida e pensei logo em Marluce, uma moça direita.

Lorival pensou: "para endireitar o meu nome porque essa não tem nada de direito."

- Claro que sim meu compadre. Pode levar.

Gritou

- Marluce, minha filhinha, venha cá.
- Oxe paínho, tá falando tão doce comigo! O que foi meu pai?
- Seu Lorival vai levar você para ir ajudar a Lindalva nos afazeres de casa. E se comporte como gente, viu.
- E eu vou quando, meu pai?

 Ninguém respondeu por alguns instantes e Lorival disse:

- Pode ser agora. Aproveita e já vai comigo e já levo as suas coisas no cavalo.
- Vai arrumar as suas coisas e mande a sua mãe trazer outro café.
- Marluce entregou o saco a Lorival.

Olhando para o céu refletiu:

 - Vai ser estranho morar noutra casa. Mas vai ser muito bom morar naquela fazenda. Tem um monte de coisas para fazer e um monte de gente que trabalha lá.
- Vamos minha filha, que o tempo passa rápido.
- Vai com Deus meu compadre e tu Marluce se ajeite como gente.

Marluce pensou:

- E desde quando fui gente?
- Faça o que quiser meu compadre, Marluce agora é tua.

Não houve conversa durante as sete léguas, até chegar na sua nova casa. Marluce pensou: o mundo abriu uma porta para mim. Já não existem amarras. Sou filha do mundo e já não tenho mais dono.

- É aqui a sua nova casa Marluce. Ó Lindalva. Lindalva, Lindalva… tás mouca condenada?

Florivaldo responde:

- Não papai. A mamãe está mexendo o doce de leite.
- Mande ela tirar do fogo e que venha aqui.
- Está bem meu papai querido!
- Cuida, troce. Pare de frescura Florivaldo.
- Esse é o nome do teu filho?
- É sim, mas não fui eu que escolhi. Foi a mãe. Promessa de Santo.
- Oi minha filha.
- Oi dona Lindalva.
- Vamos entrando que essa é a sua nova casa. Traga para cá sua trouxa, que tem um quarto aqui para você. E Florivaldo venha aqui conhecer Marluce, que veio morar com nós.
- É mamãe? É?
- É meu filhinho. Ela vai-me ajudar.

Florivaldo fez a avaliação completa. Só achou bonito o cabelo. Mas não entendeu a fama de tão namoradeira, que era Marluce. Admirou a sua altura, além dos cabelos.

- Que cabelo bonito, mulher!
- Lindalva, você viu o que o nosso filho falou de Marluce?
- Achou bonito o cabelo!
- Eu bem sabia que ele queria aqueles cabelos, para ele! E falou mais o quê?
- Achou ela alta. Só isso, Lorival.
- Olha, não deixe eles ficar muito de amizade, não. Se não as coisas pioram.
- E eu faço o quê, homem?
- Nada não. Pode deixar que vou levar ele para a feira, amanhã, e vou ter uma conversa com ele.

Lorival ensaia e debita a conversa:

- Meu filho a Marluce é uma moça muito boa. Estou pensado em ajeitar aquela casinha na fazenda Nova, e colocar vocês para construir a vossa vida.
- É, meu pai?
- É sim, meu filho. Você já tá na hora de casar. Seus irmãos todos já estão com filhos. Só falta você!
- Mas pai, eu não sei cuidar da roça!
- Aprende meu filho. É só querer!
- É papai?
- É sim. Porquê? Você não quer casar?
- Quero sim, papai. Casar e dar um bocado de netos para o senhor.
- Isso é que é um homem, meu filho. Aproveitamos já, que é caminho, e vamos passar lá no Enxú, para tu pedir a mão de Marluce em casamento, a meu compadre Zeca.
- Mas agora papai?
- Claro que sim. E ainda vou falar com o padre hoje mesmo.
- Mas papai, não é muita coisa para um dia só?
- É não, meu filho. Tá vendo o sol? Ele não espera por ninguém não!
- Ai papai, como o senhor é meu exemplo de homem.
- Se é, então vamos resolver tudo.
- Fazer o quê, né?
- O que foi, Florivaldo?
- Nada não papai. Foi o cavalo que assustou!

Diz compadre Zeca:

- A que devo a visita do meu compadre Lorival? E esse é o seu filho? Qual é mesmo o nome do moço?
- É Florivaldo, meu compadre.
- Sim, sim…o mais novo?
- Não meu compadre. Este é o Florivaldo, que ainda não casou.
- Mas vai. Não é meu filho?
- É sim papai.
- E hoje, quem insistiu em vir visitar o meu compadre, foi ele mesmo. O Florivaldo.

Florivaldo pensa: Falar, falar o quê, papai. Só se pensou!
E Lorival adianta-se:

- Fala logo de uma vez, meu filho.
- Olha, seu Zeca, eu vim aqui pedir Marluce em casamento.
- Mas claro que sim, rapaz. Tenho a grande honra em ser seu genro.

 Lorival continuou a conversa.

 - Hoje mesmo vamos passar na igreja e falar com o padre para marcar a data do casamento, porque Florival não aguenta mais esperar. Pois meu compadre, a conversa tá boa mais temos que ir. Assim que marcarmos a data, mando avisar.
- Não vai esperar nem para tomar um cafezinho?
- Agradecido, meu compadre, mas tenho que apressar os passos.
- Meu filho, vai lá para a bodega que vou passar logo na igreja.
- Mas eu vou sozinho papai?
- Claro que sim. Tua mãe não falou o que era para comprar?

Cogita Florivaldo, entre as paredes de um susto…

- Ele quer é ver eu casado. Marcar o meu casamento para logo! E eu, o que faço meu Padim Ciço?
- Cuida rapaz, antes que Zacarias feche a bodega.

Voltaram para casa, num silêncio só. Já passava do meio-dia quando chegaram. A comida não estava na mesa. Lorival não falou nada. Pensou! Lindalva ajeitava a casa e Florivaldo estava de cara caída. Lorival estava numa alegria só. Chamou os presentes na Fazenda Catolé, para anunciar o casamento.

- Meus amigos, eu não sou homem de muita conversa, mas tenho algo a anunciar. Marluce, venha aqui. Hoje eu passei lá no Enxú e Florivaldo pediu você em casamento. Seu pai aceitou e nós passamos na igreja e marcámos o casamento para este final de mês.

Marluce deu uma risada.

 - Eu? Eu casar com o seu filho? E quem disse que eu quero?
- Seu pai autorizou.
- Com todo respeito que tenho por esta família, mas eu não posso aceitar casar com Florivaldo. Eu já tenho compromisso. E, além de tudo, Florivaldo nunca me procurou.

Lorival ficou furioso.

- Então pegue nas suas coisas e some daqui.
- Eu vou mesmo. Eu não tenho dono. O mundo é a minha casa.

Antes do anoitecer Marluce foi-se embora da Fazenda Catolé, com o vaqueiro Bento, deixando Lorival num enraivecido mau estar, bem como de pasmo toda a Fazenda e arredores, na maledicência.

- Eu hein…!!!

O clima na Fazenda Catolé não ficou muito agradável. O povo desconfiava de uma paixão de Florivaldo com o vaqueiro Bento. Coisa que seu Lorival não podia nem sonhar. Florivaldo vagueava por entre as incertezas. Pelo menos isso ele demostrava. Ajudava a mãe de uma forma que o seu pai não percebesse. Mas sempre sentia o seu chegar.
Florivaldo decidiu-se a casar. Coisa difícil mas iria melhorar o clima com seu pai. Pensou que seria a forma mais fácil de decidir a sua vida e seus conflitos. Aproximou-se da filha do comerciante Ferreira. Um homem muito amigo do seu pai. Uma mulher totalmente diferente de Florivaldo. Gostava de andar a cavalo, pegar boi bravo no mato e ainda tomava umas caçhacinhas às escondidas dos seus pais. Todos lhe chamavam, pelas costas, de Chicão. Sendo seu nome Francisca, familiarmente Chiquinha. Tinha uma história muito parecida com a de Florivaldo. Este decidiu falar para o seu pai que estava gostando de Chiquinha.
Resmungou Lorival:

- Mas logo por Chicão, meu filho?
- Sim meu pai. Tenho andado noites em claro, pensado nela. Acho que temos muitas coisas em comum.
- Está bem. Esta semana vou lá na Vela e falo com seu Ferreiro e tu vai comigo.
- Está bem, meu pai.

No outro dia, por tentação do diabo, Chiquinha chegou em casa de Florivaldo, toda trajada de roupa de couro, montando uma burra mula. E, pelos visto, brava.

 - Opa seu Lorival, vim aqui atrás do senhor. Meu pai mandou perguntar se o senhor tem um garrote para vender, que ele tá precisando pra matar esta semana.
- Desapeia minina.
- Não, seu Lorival, senão esta burra não deixa eu subir novamente. Estou dando uns treino com ela.

Lorival pensou: “Ó que muié macho é essa!”

- Tenho sim. Diga a ele que venha aqui ver, porque quero falar com ele um assunto muito importante.

Chiquinha saiu numa riscada só. Lorival pensou: “será que ouviu o recado?”
Antes de anoitecer seu Ferreiro chegou na fazenda. Lorival chamou logo para entrar e tomar um café.

- O que o senhor tem para conversar comigo, meu amigo Lorival?
- O meu filho Florivaldo está andando de olho na sua filha Chiquinha e quer casar com ela.
- Venha cá Florivaldo.
- Pois não seu Ferreiro.
- Esse então é que é o cabra macho que quer casar com a minha filha?
- Sou eu sim, seu Ferreira.
- Filho de Lorival tem todo o respeito do Sertão. É claro que aceito o casamento e vamos marcar a data da festa. Ela será a sua esposa e você será o meu genro.

Seu Ferreiro pensou logo na festa para o dia de São Francisco, que vem parentes de todos os cantos do Sertão para visitar a nossa terra.

- Não se preocupe com as carne, que vou mandar para o senhor dois porcos, uma novilha, dois perús e umas galinhas.
- Está bem, meu compadre Lorival. E o que o senhor acha de agente fazer um almoço, para eles se conhecerem.
- Não precisa, meu compadre. Eles já se conhecem demais!

Tudo corre bem na Fazenda Catolé, menos os malfadados e abafados comentários. Faltando apenas dois dias para o casamento, Florivaldo andava muito preocupado com a costureira, por ter feito a sua calça muito curta.
De repente chega Chiquinha em sua égua. Florivaldo corre para junto da mãe.

- O que foi meu filho?
- É Chiquinha que está aí!
- Parece que tem medo da sua noiva! Ela só veio pegar os bicho, para a vossa festa.

Chegando de surpresa, respondeu Lorival, ciente que o casamento desta vez ia sair. Chiquinha estava bem, com sempre, em cima daquela égua. Todos respeitavam. Não tinha vaqueiro melhor do que ela, naquela região. Todos zombavam que era ela que ia dominar o Florivaldo na cama. Esse era o principal motivo de festa na região.

O casamento foi marcado para as onze horas da manhã. Às oito, Florivaldo já estava pronto, esperando o jipe que veio da prefeitura, presente de casamento do prefeito. Enquanto isso, a sua futura mulher, nem tinha experimentado o vestido. Estava matando dois bodes, que tinha ganho de presente e tomando umas cachaças. Estava feliz da vida. A consciência estava bem, também (?). Seu pai tomou a frente e assumiu o comando.

- Cuide, minha filha, está na hora de ir para igreja. Deixe que suas tias terminem de preparar as carnes.
- Está bem, meu pai. E o senhor já tá pronto?
- Claro que sim, minha filha. Hoje é um dia muito especial. Sua mãe está pronta, também.

A mãe e a tia Josefina jogaram Chiquinha no banheiro. Vestiram-lhe o vestido. Grande admiração enquanto colocavam os enfeites. Chiquinha achava tudo muito engraçado. Já estava bem mamadinha e pediu para seu primo trazer mais uma dose. Sua mãe, em coro com a tia Josefina, impediram tal barbaridade.

- Pare, minha filha. Tu quer chegar na igreja mamada? O jipe já chegou. Vamos minha filha. Chega Ferreiro, a nossa filha já está pronta.

Enquanto isso, Chiquinha tomava mais uma dose de cachaça, com a rabada de porco. Foi a última a entrar no jipe. Entrou na igreja com o seu pai e, no altar, estava Florivaldo, tão delicado quanto uma flor.

Pensou Chiquinha: “ó homem besta”.

Florivaldo sorria muito para si próprio. Os convidados estavam todos admirados com o fato. A festa continuou por toda a tarde no sítio, com muitos convidados, muito churrasco e forró pé de serra. Foi até tarde da noite. Carne e cachaça, não faltou para ninguém. Chiquinha estava muito feliz. Cumprimentava todos os convidados, enquanto Florivaldo estava com a sua mãe, sempre ao seu lado. Passou meio despercebido. O centro da atenção foi para Chiquinha. Já tarde na noite só restava o jipe com o motorista da prefeitura e uma mão cheia de resistentes cachaceiros.

O presente do prefeito não podia ir embora. O motorista já estava muito cansado. Chamou Lorival e falou que estava na hora de ir embora. Foi então que, Florivaldo e Chiquinha, caíram em si com o casamento. Florivaldo ficou inibido ao lado dos seus parentes, enquanto Chiquinha se despedia de todos, aproveitando para trazer mais uma garrafa de cachaça. Seguiram para a sua nova morada, no Sítio Velas. Não deu trabalho para dormir.
Chiquinha caiu no alpendre e, lá mesmo, adormeceu e dormiu, enquanto Florivaldo, lutando contra os medos das trevas do escuro, adormeceu ao seu lado.

2017, Braga / Portugal.


Edição: Paulo Passos






domingo, 3 de setembro de 2017

SOPA DE TOMATE


Ingredientes:

- Tomates q.b.
- 1 cebola
- 2 chu-chu
- 1 pimento
- Azeite
- Sal
- Pimenta do reino



Modo de preparação:

Refogue a cebola no azeite.
Corte os em pedaços e adicione.
Tempere com sal.
Quando pronta, polvilhe com a pimenta.



Envolva e delicie-se ... quente ou fria ...
... com um bom pão, queijo e um copo de vinho.

Edição: Janiel Martins 

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

CAFÉ COM LETRAS - NO MEIO DO TEMPO


Genuinidade, honra e notabilidade.
Essência.
Essência nordestina. 
Um conto do Sertão ...
... um conto de Janiel Martins ... 


NO MEIO DO TEMPO
(Janiel Martins, RN/Brasil. 2017)
            
- Mininos venham todos para dentro, que vamos lá na casa do seu tio Zacarias.
- Fazer o quê, mãe?
- Vamos lá que teu pai mandou chamar ele para ser padrinho de um dos mininos.
 - E vai ser padrinho dos dois, mãe?
 - Não, que não pode, meu filho.
 - E quem vai ser padrinho do outro?
 - Não sei, seu pai que vai chamar outro. Quem ele quiser. Cuida, vamos tomar banho e ajeitar a carroça para colocar os meninos, quero ver bem limpinha para não sujar as cobertas. Chega bocado de peste, embraçar o cabelo, passar perfume e tão tudo direitinho?
- Tamos sim, mainha.
- Se ensaca direito Clodoaldo, tu quer ficar em casa sozinho?
- Não mãe, eu também vou.
- Eu vou logo avisando, se derem trabalho é a ultima vez que saio com vocês de casa. E você, Maria, é para olhar comigo os mininos, entendeu? Lindolfo traga a carroça.
- Tá aqui, mãe.
- Deixa eu ajeitar e vão se comportando que não quero passar vergonha. Tá tudo fechado! Vamos com Deus e meu Padim Cíço. Fazia tanto tempo que não saía de casa. Que sensação boa, proteja eu e meus filhos, meu Padim Cíço. Que bonito! Tudo já crescendo e que venha mais meu Deus e com muita saúde. Ois troce, para dar trabalho. Se ajeite bocado de peste ruím.
- Ai mãe, a senhora só dá em mim!
- Claro. Vocês me deixam doida. Na próxima é você, Lindomar.
- E eu fiz o quê, mãe?
- Não sei, imagino. Que coisa bonita meu Deus os meus mininos tudo arrumadinho e de sapato, acho bonito demais esse bocado de meninos e com essas roupinhas com um bocado de cor.

Cosme e Cosmo iam quietinhos. Nem parecia que estavam dentro de um carro de mão. Na primeira enrolada encontrou-se com a sua prima, que morava no Sítio Angicos. Fazia algum tempo que não se viam. Olhou para todos os meninos e ficou perdida.

- E cadê os gêmeos, minha prima, que eu ouvi dizer que já tinha parido?
- Estão aqui, muié. Não sou de ferro para carregar no colo. Quando tenho que sair de casa, trago na carroça. É bom demais, não dá trabalho e é bem maneirinho.
- Mas comadre, como tu sois danada mesma!
- Vamos andando, que vou lá em Zacarias e tenho que chegar em casa antes de anoitecer, que esqueci de colocar a luz e fósforo na porta. Esses mininos me deixam doida. Venha passar um dia lá em casa, minha prima. Só mande avise antes que mando prender uma galinha para nós comer no almoço.
- Tá bem, vão com Deus.
- Páre aqui, bocado de peste. Ouviu o que falei em casa, mas vou repetir aqui de novo. Quero todo mundo quietinho, e quando eu falar é para obedecer, senão nunca mais saem de casa comigo e quando chegar lá é para tomar a bênção ao seu tio e a sua tia. Senão Deus castiga. E tudinho pertinho de mim.
- Ó de casa?
- Ó de fora?
- É Rosa, Zéfinha!
- Ó mulher, vão entrando. Eu tou tomando banho.

Houve um descontrolo, ânsia e falta de ar.

- Ó bocado de beste ruim, se ajeitem. Senão vamos embora daqui mesmo e quando chegarem em casa vão tudinho levar uma surra. Pega em Cosme, Maria, que eu pego em Cosmo. Lindomar, bota a caroça debaixo do pé de imbú.
- Entra muié. Tava tomando banho.
- A bençã.
- Um de cada vez, meus filhos.
- E como tão os gêmeos? Já escolheu o nome?
- Já. É Cosmo e Cosme.
- Já tão grandinhos. E é bom mesmo, colocar nome de santo.
- E cadê Zacarias?
- Tá por aí, no roçado. Daqui a pouco aparece por aqui.
- E os teus mininos, tão tudo bem Zéfinha?
- Tão, só tava com uma gripe danada, mais mandei mãe fazer um lambedor e ficaram tudo bom. Se tu quiser dar pró teus mininos, para evitar pegar essa gripe véia. Pode dar.
- Não Zéfinha, que eu também fiz um, para evitar pegar essas gripe véia e tou dando todo dia uma colhezinha. E fiz com cupim, que é bom demais. Minha avó que me ensinou.
- Mãe, posso ir brincar?

Zefinha respondeu

- Deixa eles ir, Rosa.
- Vão, mais com cuidado.

E Rosa continua …

- Zefinha, eu vim aqui chamar, para tu e Zacarias ser padrinho de um dos mininos, que Benedito mandou eu perguntar.
- Vou perguntar para Zacarias, mas quero sim. Ó Francivaldo vai chamar o teu pai.
- Pra quê mãe?
- Cuida peste. Vai logo.
- Oi tudo bem, Rosa?
- Tudo.

Zefinha adiantou …

- A Rosa veio aqui saber se agente quer ser padrinho de um dos mininos.
- Vamos sim, e de qual vai ser?
- Qualquer um. Vamos arrumar outro e nós ajeita o batizado.
- Tá bom.

Zacarias, orgulhoso, diz para a mulher:

- Muié, bota um café no fogo.
- Já tá pronto.
- Coloque para os mininos, Zefinha e traga uma copo pra eu. Cuida troce. E cadê Benedito?
- Foi trabalhar, só vem na próxima semana, se Deus quiser.
- Pois tá.
- Nós tamos indo embora, e quando tiver mais perto eu mando avisar. Chega pra tomar a bençã ao seu tio e a sua tia para a gente ir embora. Traga a carroça Lindomar. Até a próxima, se Deus quiser.
- Vão com Deus.
- Cuida que o sol já tá caindo. Apresse os passos mininos. Obrigado, meu Padim Ciço, que eles quiseram. Agora é com Benedito. Ai que falta que você me faz meu véio!
- O que foi mãe?
- Nada não. Espera aí, vão tudinho para beira da estrada. Meu Deus tá faltando um dos mininos …. Maria Salestina, Lindomar, Clodoaldo, Cleidebergue, Maria Vitória, Lindolfo, Gerusa. Meu Deus, e qual que tá faltando? Cosme e Cosmo tão dentro da carroça. Minino, tão tudinho aí?
- Tamos sim mãe.
- Tem nove, tá certo meu Deus. Não é que tou ficando doida mesmo?
- Tás doida?
- Toma aqui, peste ruim.
- Eu de novo, mãe?
- Meus Deus, já tá escurinho, e não sei onde deixei o fósforo e ainda tenho que fazer o fogo para esquentar a comida e fazer o café.

            SERTÃO, TAPUIA 06 de Novembro de 1998

Edição: Paulo Passos






domingo, 27 de agosto de 2017

FRANGO NA PRESSÃO


Ingredientes:

- Frango
- Abóbora
- Beterraba
- Cebola
- Louro
- Alho
- Azeite
- Sal
- Malagueta


Modo de preparação:

Corte o frango em pedaços e retire grande parte da pele.
Coloque-o na panela de pressão, temperando com sal, malagueta,
louro, o alho esmurrado e o fio de azeite.
Depois de bem lavados e cortados, adicione a beterraba
(não descarte as folhas nem os caules) e a abóbora, ao que
junte um copo de água.
Após pegar a pressão deixe cozinhar durante cerca de 
20 minutos, em lume brando.

Acompanhe-se e acompanhe com um copo de vinho ...!

Imagens: Janiel Martins 

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

CAFÉ COM LETRAS - PLURALIDADES SINGULARES


Pluralidades no Singular

Singularidades no Plural


Excerto de UM HOMEM SINGULAR (Christopher Isherwood):

“(…) GEORGE VOLTARÁ PARA INGLATERRA?
NÃO. FICARÁ AQUI.
POR CAUSA DE JIM?
NÃO. JIM AGORA PERTENCE AO PASSADO.
JÁ NÃO TEM UTILIDADE PARA GEORGE.
MAS GEORGE RECORDA-O COM TANTA DEDICAÇÃO.
GEORGE FORÇA-SE A RECORDAR. TEM RECEIO DE ESQUECER.
JIM É A MINHA VIDA, AFIRMA.
MAS TEM DE ESQUECER, SE QUISER CONTINUAR A VIVER.
JIM É A MORTE.
NESSE CASO PORQUE FICARÁ GEORGE AQUI?
FOI AQUI QUE ELE ENCONTROU JIM.
ACREDITA QUE ENCONTRARÁ AQUI UM OUTRO JIM.
EMBORA NÃO O SAIBA, COMEÇOU JÁ À PROCURA.
PORQUE ACREDITA GEORGE QUE O ENCONTRARÁ?
ELE SÓ SABE QUE TEM DE ENCONTRÁ-LO.
ACREDITA QUE O ENCONTRARÁ PORQUE TEM DE O ENCONTRAR.
MAS GEORGE ESTÁ A ENVELHECER.
DENTRO DE POUCO TEMPO NÃO SERÁ DEMASIADO TARDE?
NÃO UTILIZE ESSAS PALAVRAS QUANDO FALA COM GEORGE.
ELE NÃO LHES DARÁ OUVIDOS.
NÃO SE ATREVERÁ.


DIABOS LEVEM O FUTURO
KENNY E OS MIÚDOS QUE O GOZEM.
DEIXEM QUE CHARLEY GUARDE O PASSADO.
GEORGE APEGA-SE APENAS AO AGORA.
É AGORA QUE TEM QUE DESCOBRIR OUTRO JIM.
É AGORA QUE TEM DE AMAR.
É AGORA QUE TEM DE VIVER...(...)"



                                                         https://youtu.be/mOmdNNJ_64Q
(Sugestão de Tiago Lemos)

Edição de Paulo Passos
Imagens: Fotos do livro Um Homem Singular












domingo, 20 de agosto de 2017

CAFÉ COM LETRAS - MADAME SATÃ

MADAME SATÃ

João Francisco dos Santos Sant´Anna

João Francisco dos Santos Sant´Anna(Rio de Janeiro, 1900 - 1976)


Satã (Madame) ... travesti carioca malandro. The first ...!

O MITO DA LAPA:

http://blogdofredericosueth.blogspot.pt/2012/11/o-mito-da-lapa-madame-sata.html

João Francisco dos Santos Sant´Anna (Glória do Goitá, 25 de fevereiro de 1900 — Rio de Janeiro, 11 de abril de 1976), mais conhecido como Madame Satã, foi um transformista brasileiro, visto como personagem emblemático da vida noturna e marginal carioca na primeira metade do século XX.
Criado numa família de dezessete irmãos, diz-se que João Francisco chegou a ser trocado, quando criança, por uma égua. Jovem, foi para Recife, onde viveu de pequenos serviços prestados. Posteriormente, mudou-se para o Rio, indo morar no bairro da Lapa. Analfabeto, o melhor emprego que conseguiu foi o de carregador de marmitas, embora houvesse o boato de que foi cozinheiro de mão-cheia. Considerado marginalizado, acredita-se que o fato de ter sido negro, pobre e homossexual tenha contribuído.

Dito dotado de uma índole irônica e extrovertida, Santos encantou-se pelo carnaval carioca. Foi assim que, em 1942, ao desfilar no bloco-de-rua Caçador de Veados, surgiu seu apelido. O transformista se apresentou com a fantasia Madame Satã, inspirada em filme homônimo de Cecil B. DeMille.
Era freqüentador assíduo do bairro onde morava (conhecido como reduto carioca da malandragem e boemia na década de 1930), onde muitas vezes trabalhou como segurança de casas noturnas. Cuidava que as meretrizes não fossem vítimas de estupro ou agressão.


Foi preso várias vezes, chegando a ficar confinado ao presídio da Ilha Grande, agora em ruínas. Freqüentemente, Madame Satã enfrentava a polícia, sendo detido por desacato à autoridade. Considerado exímio capoeirista, lutou por diversas vezes contra mais de um policial, geralmente em resposta a insultos que tivessem como alvo mendigos, prostitutas, travestis e negros.
É considerado uma referência na cultura marginal urbana do século XX.
Faleceu logo após a sua última saída da prisão, em abril de 1976 em sua casa, hoje um camping.
No ano de 2002, foi rodado no Brasil um filme sobre sua vida, que leva também o nome de Madame Satã, premiados nacional e internacionalmente. Nesse filme, João Francisco dos Santos foi interpretado pelo ator Lázaro Ramos.











Edição: Janiel Martins
Fonte das imagens: internet

NOTAVELMENTE, MADAME SATÃ

Sr. João Francisco dos Santos Sant´Anna

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quarta-feira, 16 de agosto de 2017

SOPA DE PIMENTOS VERMELHOS


Ingredientes:

- 4 pimentos vermelhos
- 2 cenouras
- 1 batata
- 1 cebola
- 2 dentes de alho
- Feijão verde q.b.
- 1 folha de louro
- Sal
- Azeite

Modo de preparação:

Numa panela refogue a cebola em azeite.
Limpe, lave e corte os legumes.
Adicione-os na panela.
Junte o alho e a folha de louro.
Tempere com sal.
Cubra com água e deixe cozer.


Retire a folha de louro e passe a mistura no liquidificador.
Corte, transversalmente, as vagens.
Volte a deitar na panela, juntamente com o feijão verde já cortado.
Cozinhe e confira sabores.


Acompanhe com queijo, pão, figos e um copo de vinho tinto.

Quente ou fria, pois...repita...!!!

Edição: Janiel Martins 



domingo, 13 de agosto de 2017

CAFÉ COM LETRAS - PAIXÕES COM MAR

Adolfo Caminha, Brasil. Fonte da imagem: internet.
"(...) Estava satisfeita a vontade de Bom-Crioulo. Aleixo surgia-lhe agora em plena e exuberante nudez, muito alvo, as formas roliças de calipígio ressaltando na meia sombra voluptuosa do aposento, na penumbra acariciadora daquele ignorado e impudico santuário de paixões inconfessáveis (...)"

Bom-Crioulo, Adolfo Caminha.

Guilherme Simões, Portugal. Fonte da imagem: facebook.
MERGULHO
(Guilherme Simões)

Fui dar um mergulho como o planeado, mas um pouco mais tarde.
Ele foi comigo e, ao chegar à zona balnear do Negrito, estendi a toalha e ele também.
Reparei que não se sentia muito confortável. Estava habituado a areia e ali era cimento.
Passei-lhe o protector solar, respondeu que não era preciso.
Eu disse-lhe que era melhor.
E tu? Perguntou ele. Eu vou primeiro dar um mergulho. Não respondeu.
Tirei uma almofada insuflável, enchi-a e dei-lhe.
E tu? Eu o quê? Ah, não gosto de me deitar!
Aceitou, agradeceu, pôs os óculos de sol e deitou-se.
Pernas ligeiramente abertas e os braços bem abertos, como se estivesse crucificado.
Vou dar um mergulho, disse eu.
Ele não respondeu mas fez um pequeno gesto com a cabeça de concordância.
Dei várias braçadas e afastei-me do cais para o poder ver.
Lá estava deitado na mesma posição.
Quando saí do mar e me sentei na toalha ele, sem se mexer, disse: tens água? Claro que tenho mas está natural. Serve, disse ele. Sentou-se, dei-lhe a garrafa de água, ele bebeu um pedaço e deu mais gole. Tinha sede, disse.
Não respondi porque ele não imaginava a sede que eu tinha, sede de lhe beber o pensamento, de nadar na alma dele.
Agora é a minha vez de dar um mergulho.
Levantou-se, deu-me os óculos de sol e dirigiu-se aos degraus que acedem ao mar.
Fiquei a observar.
Ele a descer as escadas, vi-o a desaparecer aos poucos.
Fiz uma coisa que ele detesta: fumar um cigarro.
Dirigi-me ao varandim de tubo pintado de azul e fiquei a vê-lo na água.
Ele viu que estava a fumar e abanou a cabeça em sinal reprovativo.
Apaguei o cigarro e fiquei a vê-lo sair da água.
Visão espantosa, o sol a iluminar aquele corpo esguio, os calções colados ao corpo mostrando as formas belas do sexo, a água escorria pelo corpo e cara, ele sacudiu a cabeça, passou as duas mãos pelo cabelo e sacudiu novamente.
Estava majestoso, olhou para mim e disse: água belíssima. 
Dirigiu-se para a toalha, vi os olhares que as fêmeas lhe lançavam. 
Afinal, ele era meu!
Fui também para a toalha e ele disse: tira os óculos!
Para quê? O sol incomoda!
Ele repetiu: quero ver os teus olhos!
Eu tinha medo que ele visse a luxúria que os meus olhos deixavam ver.
Contudo, tirei os óculos e ele disse: eu sabia.
Não respondi, ele voltou a deitar-se e eu nada disse.
Ficámos em silêncio uns minutos.
Ele, sem se mexer, disse: este sol é gostoso mas é perigoso.
Deu uma risada, olhei e percebi, os calções tinham um grande inchaço.
Fiquei sem saber o que dizer e fazer.
Mas percebi que tinha dado UM MERGULHO NA FELICIDADE.

Jorge Amado, Brasil. Fonte da imagem: Internet
"(...) desde pela manhã cedinho até a hora da maré vespertina quando os saveiros partes mar afora na procissão da Janaína, à frente o de mestre Flaviano conduzindo o presente principal, o dos pescadores. 
No meio do mar a Rainha espera, trajada de transparentes conchas azuis, na mão o abebé, odoia, Yemanjá, odoia! (,,,)"

Tereza Batista cansada de guerra, Jorge Amado.


Edição: Janiel Martins














terça-feira, 8 de agosto de 2017

PUDIM DE COCO NA PANELA DE PRESSÃO


Ingredientes:

- 1 lata de leite condensado
- 1 lata de leite de coco
- 3 ovos inteiros
- 1 colher de sopa de amido
- 1,5 chícara de açúcar

Modo de preparação:

Coloque o açúcar num tacho e leve ao lume a caramelizar.
Bata, no liquidificador, os restantes ingredientes, considerando
que o leite de coco deve ser a mesma quantidade do leite condensado.
Unte a forma de pudim com o caramelo que preparou, 
onde deitará a mistura.
Vede-a bem com papel de alumínio e coloque-a dentro
da panela de pressão, com água de modo a que a forma não fique a boiar.
Após pegar a pressão, espere 20 minutos.
Deixe despressionar e desenforme.


Sirva-se, sirva ... como, quem e quando entender...!

Edição: Janiel Martins